Madalena a Pecadora, de Lilian Faschinger
Madalena a Pecadora
Lilian Faschinger
Trad. Maria Emília Ferros Moura
317 Páginas
Eis senão quando, Madalena Leitner, hedonista e pecadora, montada numa Push 800, com side-car, irrompe das trevas da beatice pindérica, do desconhecido e do anonimato, para raptar – o sonho de qualquer homem... ser raptado por uma mulher bonita, sexualmente activa, inteligente e emancipada – Hochwürden, o cândido e imaculado sacerdote, enquanto este apascentava os seus fiéis (a quem garantia uma boa percentagem de salvação no balanço do juízo final) e celebrava a missa no Domingo de Pentecostes, para o encostar amarrado – e amordaçado pelo body dela, aliás um body de Kashiyama – à casca dura de uma robínia (espécie de acácia, porquanto importa salientar que seria desta madeira, a de acácia, que era feita a arca onde se guardava a Tora), e assim obrigá-lo a ouvi-la, em confissão, os seus sete pecados (i)mortais, que haviam sido a sua vida até então.
Vagabunda motoqueira vestida com justo e aderente fato de cabedal preto e botas Bruno Magi de grossas solas e "rodado", apreciadora da Divina Comédia, de Dante Alighieri, proprietária e adepta do canivete suíço, melómena fixada em O Cravo Bem Temperado, de Johann Sebastian Bach, do qual tem duas cassetes, que são as únicas cassetes que possui, e que ouve repetidamente no seu walkman Sony cor-de-rosa, viciada nas doçuras e gastronomia austríacas, que também tinha por hábito usar na profissão do crime (carteirista) a indumentária da Ordem das Carmelitas Descalças, traje que lhe fora oferecido pela sua irmã mais nova das suas irmãs mais velhas, depois desta ter deixado o monastério contemplativo decorrido um ano de noviciado mas sem pronúncia de votos, se fizera à estrada com os óculos de motociclista do tio-avô Karl, a fim de evitar tornar-se em mais uma tradicional esposa austríaca de um qualquer tradicional marido austríaco, embora se tenha antes despojado de toda a sua bagagem sedentária, incluindo os seus livros de cultos e doutos eruditos (igualmente austríacos), em particular dos psicanalistas, psicólogos, psiquiatras e psicoterapeutas, para frequentar o mundo e conhecê-lo, sem ser pel'O Grande Atlas Ilustrado de Lingen, como fizera e se contentara até essa altura, tornando-se numa espécie de Ulisses feminino da modernidade motorizada, caindo em todas as armadilhas e peripécias do destino, e roteiro mundano, mas que resolve parar para pensar na clareira de uma floresta, sob a fronde da dita robínia, na presença de uma testemunha privilegiada, imprescindível e voluntária à força com investidura e poder espiritual suficiente para interceder junto de Deus, a fim de perdoá-la e absolvê-la, logo sacerdote católico apostólico romano, missão que ele espontânea e prontamente desempenhou tirando o máximo prazer disso, uma vez que o seu estatuto de raptado tal lhe impunha, como permitia, diremos nós que somos profícuos e useiros às inspirações do Maligno.
Mas não se creia, pelo afirmado, que é apenas mais um bom romance, porque não o é... É simplesmente fabuloso. Vertiginoso. Louco. Logo de respeito, porquanto a autora não se coíbe de reiterar pela boca da protagonista, que sempre respeitou os loucos, e ser esse um recomendável e salutar hábito. Sem caramelismos! Nem descurar que toda e qualquer semelhança entre Madalena e as fémeas do Louva-a-Deus, pode não ser apenas pura coincidência...
Lilian Faschinger
Trad. Maria Emília Ferros Moura
317 Páginas
Eis senão quando, Madalena Leitner, hedonista e pecadora, montada numa Push 800, com side-car, irrompe das trevas da beatice pindérica, do desconhecido e do anonimato, para raptar – o sonho de qualquer homem... ser raptado por uma mulher bonita, sexualmente activa, inteligente e emancipada – Hochwürden, o cândido e imaculado sacerdote, enquanto este apascentava os seus fiéis (a quem garantia uma boa percentagem de salvação no balanço do juízo final) e celebrava a missa no Domingo de Pentecostes, para o encostar amarrado – e amordaçado pelo body dela, aliás um body de Kashiyama – à casca dura de uma robínia (espécie de acácia, porquanto importa salientar que seria desta madeira, a de acácia, que era feita a arca onde se guardava a Tora), e assim obrigá-lo a ouvi-la, em confissão, os seus sete pecados (i)mortais, que haviam sido a sua vida até então.
Vagabunda motoqueira vestida com justo e aderente fato de cabedal preto e botas Bruno Magi de grossas solas e "rodado", apreciadora da Divina Comédia, de Dante Alighieri, proprietária e adepta do canivete suíço, melómena fixada em O Cravo Bem Temperado, de Johann Sebastian Bach, do qual tem duas cassetes, que são as únicas cassetes que possui, e que ouve repetidamente no seu walkman Sony cor-de-rosa, viciada nas doçuras e gastronomia austríacas, que também tinha por hábito usar na profissão do crime (carteirista) a indumentária da Ordem das Carmelitas Descalças, traje que lhe fora oferecido pela sua irmã mais nova das suas irmãs mais velhas, depois desta ter deixado o monastério contemplativo decorrido um ano de noviciado mas sem pronúncia de votos, se fizera à estrada com os óculos de motociclista do tio-avô Karl, a fim de evitar tornar-se em mais uma tradicional esposa austríaca de um qualquer tradicional marido austríaco, embora se tenha antes despojado de toda a sua bagagem sedentária, incluindo os seus livros de cultos e doutos eruditos (igualmente austríacos), em particular dos psicanalistas, psicólogos, psiquiatras e psicoterapeutas, para frequentar o mundo e conhecê-lo, sem ser pel'O Grande Atlas Ilustrado de Lingen, como fizera e se contentara até essa altura, tornando-se numa espécie de Ulisses feminino da modernidade motorizada, caindo em todas as armadilhas e peripécias do destino, e roteiro mundano, mas que resolve parar para pensar na clareira de uma floresta, sob a fronde da dita robínia, na presença de uma testemunha privilegiada, imprescindível e voluntária à força com investidura e poder espiritual suficiente para interceder junto de Deus, a fim de perdoá-la e absolvê-la, logo sacerdote católico apostólico romano, missão que ele espontânea e prontamente desempenhou tirando o máximo prazer disso, uma vez que o seu estatuto de raptado tal lhe impunha, como permitia, diremos nós que somos profícuos e useiros às inspirações do Maligno.
Mas não se creia, pelo afirmado, que é apenas mais um bom romance, porque não o é... É simplesmente fabuloso. Vertiginoso. Louco. Logo de respeito, porquanto a autora não se coíbe de reiterar pela boca da protagonista, que sempre respeitou os loucos, e ser esse um recomendável e salutar hábito. Sem caramelismos! Nem descurar que toda e qualquer semelhança entre Madalena e as fémeas do Louva-a-Deus, pode não ser apenas pura coincidência...
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