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Mostrando postagens de dezembro, 2010

A Maldição de Petrarca (conto)

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“O que mais prejudicou Petrarca aos olhos de Laura – foram os Sonetos . ” - Eça de Queirós, in Cartas d’Amor / Correspondência de Fradique Mendes A falta de algo é apenas um reconhecimento de quanto “esse alguma coisa” é deveras importante para quem assim sente a dita ausência, quase imperiosa ou momentaneamente fundamental, que o carecido encarece, se afoita no universo dos não-seres como se tanto fosse uma primazia assaz valorizada. Se for pessoa, posto que todas são além de seres indiscutíveis, também indivíduos com direitos e identidade inalienáveis, a carência mistura-se com outros sentimentos de diferente motivação, significado e afectividade, indo desde a saudade à impotência fatal, a que nunca serão alheios a ética e a biologia, a formação e a natureza, ou a personalidade dos sujeitos que tomaram a nomeada consciência como circunstância evidente e, quiçá, incontornável. Ao fenecer do dia, se escurece, quando o lusco-fusco se volatiliza em negritude, aquilo que registamos não é
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Idílio (1) Praias que banha o Tejo caudaloso, Ondas que sobre a areia estais quebrando, Ninfas que ides escumas levantando, Escutai os suspiros de um saudoso. E vós também, ó côncavos rochedos, Que dos ventos em vão sois combatidos, Ouvi o triste som dos meus gemidos, Já que de amor calais tantos segredos. Ai, amada Tirceia, se eu pudera Os teus formosos olhos ver agora, Que depressa o pesar, que esta alma chora, No gosto mais feliz se convertera! Oh, como então ficaras conhecendo Quanto te amo, se visses a violência Com que estão dos meus olhos, nesta ausência, As saudosas lágrimas correndo! Tanto neste pesar, que estou sentindo, O triste coração se desfalece, E tanto me atormenta, que parece, Que ao sofrimento a alma vai fugindo! Mas oh! Qual há de ser a crueldade Deste terrível mal em que ando envolto, Se a qualquer parte, enfim, que os olhos volto Imagens estou vendo de saudade! Uma serena tarde, já sol-posto, Te vi sobre esta penha estar sentada; Ali naquela fonte prateada (2) Est

Cantata de Dido

Já no roxo ambiente branqueado, As prenhes velas da troiana frota Entre as vagas azuis do mar dourado Sobre as asas dos ventos se escondiam. A misérrima Dido Pelos paços reais vaga ululando (1) C’os turvos olhos inda em vão procura O fugitivo Eneas. Só ermas as ruas, só desertas praças A recente Cartago lhe apresenta. Com medonho fragor, na praia nua, Fremem de noite as solitárias ondas; E nas douradas grimpas (2) Das cúpulas soberbas Piam noturnas, agoureiras aves. Do marmóreo sepulcro, Atónita imagina Que mil vezes ouviu as frias cinzas Do defunto Siqueu, com débeis vozes, Suspirando chamar: -- Elisa! Elisa! (3) D’Orco (4) aos tremendos numens Sacrifícios prepara; Mas viu, esmorecida, Em torno dos turícremos (5) altares Negra escuma ferver nas ricas taças, E o derramado vinho Em pélagos de sangue converter-se. Frenética delira, Pálido o rosto lindo, A madeixa subtil desentrançada; Já com trémulo pé entra sem tino No ditoso aposento, Onde do infido amante Ouviu, enternecida, Magoados