Para Esse Peditório Já Dei
E Viva a República!
"Quando vi a víbora cegui os olhos. Alavanti a saia, brandi a cana, uma, duas, três, sete e vinte vezes, sobre a cabeça da bicha. Ela era azul, castanha e delgada. Assim. (...) Parecia um pensamento. Ali no chão. Di-lhe bem umas trinta canadas sobre a espinha e cabeça."
In O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge.
É significativamente lamentável que aquelas pessoas que tão veementemente se insurgiram contra os teores e conteúdos das minhas Crónicas (In)Divisas, saídas então no jornal portalegrense Fonte Nova, sobretudo quando nelas me referia a actos de gestão da coisa pública, em que salientava a necessidade de se estabelecerem voluntariamente medidas e políticas concretas com vista a objectivar a sustentabilidade, a contemplá-la, garanti-la e reforçá-la, porquanto corríamos o risco de num futuro próximo virmos a fazê-lo obrigatoriamente, pela pertinácia pouco esclarecida e forçosa do tem-que-ser que, como todos muito bem sabemos, tem muita força, não venham agora com igual veemência e empenho vociferar para os mesmos cafés e esquinas dos Rossios, confirmando que já sabiam que isto ia acontecer pois tinham-no lido nelas, nessas excomungadas crónicas, cujo único defeito que lhe encontraram, como basto motivo para a dor de corno que lhes provocou a tamanha comichão nos tutanos da consciência, era ou foi, o de estarem com alguma lógica e sensata razão. E é pena, porque essa atitude seria interpretada como um rebate de consciência, um remorso adulto e avisado, demonstrativo da capacidade cívica e educada que gerações alfabetizadas ganharam com a escolaridade (obrigatória?) tida, ou pelo tempo que passaram a puir os fundilhos nas carteiras da Corredora, da Fontedeira, da Estrada da Serra e do Magistério, como sob os demais "edificados" telhados na alçada dos Duarte Pacheco, deste e anterior tempo, tecendo e remendando os palimpsestos da Cartilha herdados ao serôdio de um João de Deus que lhes acordou as mentes para as manufacturas do odiar com facilidade, e respeitar com despeito ou exagerada e precavida moderação, ainda assim o respeitado não lhe dê uso e se convença ser isso sinal do considerá-lo alguém.
Todavia, é um lamento pouco pronunciado e de menos lamentado, uma vez que mais se assemelha àquele "cochicho murmurado" no escuro da plateia durante uma sessão de dejá vu como as que habitualmente se exibem nos actuais palcos da originalidade, entre velhos Marretas do mesmo ofício, alicerçado no contrabando platónico entre o ideal e o real à mercê do vice-versa, que é câmbio para todo e qualquer talento. É antes um chorinho sob a batuta do não-te-disse-agora-aguenta-te que é para ficares a saber o que é bom prà tosse, com que sacudir a água do capote, e determinar a forma de colaboração regimental disponível sob a bitola do vamos ver o que se pode arranjar, mas desde já te digo que não mereces nem um quinto de quanto possa vir a fazer por ti. Murmúrio assaz legítimo, considerando que o não-fazer me é um direito consagrado agora, como o foi o teu igual não-fazer nem deixar que alguém faça quando estavas sentado na burra. Porque, caro (e)leitor, não é por teres tido toda a vida uma fértil sorte e caganeira, que se conquista a cátedra de passar atestados de tacanhez & vilanagem a toda a gente, apenas porque ela – essa gente – é diferente e a falta de cuidados paternos/maternos a incapacitou (p.ex, com 71%) para toda a vida. Porque, até podes ter direito à ignorância e indiferença, até podes achar que é um bem voltar à terra tal e qual como caíste do sobreiro, agora do que não te assiste qualquer direito é o de impedir o acesso ao conhecimento e cultura a quem não bate palminhas aos teus arrazoados, requiens pindéricos, discursos de homenagem e suserania, elegíacos epitáfios, com a respeitável e diplomática inteligência do burro coça o burro, porque se aqui nada foi dito acerca do passamento de José Saramago, não foi por ressaibo, negligência nem má vontade, mas sim porque nada há a dizer quando uma vida se cumpre, seja ela a de um escritor Prémio Nobel, seja a de uma couvinha tronchuda ou galega, posto que a vida, isso que se supõe ser uma linha continua entre o nascer, crescer, procriar e morrer, é igual para todos, e não é agora que morreu que lhe vou ler a obra, uma vez que o li e divulguei em basta suficiência, mesmo sabendo que as susceptibilidades feridas, ao fazê-lo, podiam exercer o seu direito de afronta, ressentindo-se com a ousadia, e retaliarem com a respectiva excomunhão. Que, aliás, de nada lhes valeu, uma vez que continuei a escrever e, ao contrário deles, a ser lido, considerando que as suas publicações e pasquins encerraram a loja com a crise, em consequência de uma outra anterior que era a de valores humanos e éticos, que é coisa que não vinha de brinde, como as cartas de condução, nas farinhas Amparo, Predilecta e Trinta e Três.
Portanto, convinha que se deixassem de queixinhas e lamechices, que para esse peditório já dei! Porque só há uma maneira de celebrar/homenagear legitimamente um autor, que é lendo-lhe a obra, e isso eu fiz de fio a pavio, como se estivesse a ler o Pentateuco dos pequeninos.
"Quando vi a víbora cegui os olhos. Alavanti a saia, brandi a cana, uma, duas, três, sete e vinte vezes, sobre a cabeça da bicha. Ela era azul, castanha e delgada. Assim. (...) Parecia um pensamento. Ali no chão. Di-lhe bem umas trinta canadas sobre a espinha e cabeça."
In O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge.
É significativamente lamentável que aquelas pessoas que tão veementemente se insurgiram contra os teores e conteúdos das minhas Crónicas (In)Divisas, saídas então no jornal portalegrense Fonte Nova, sobretudo quando nelas me referia a actos de gestão da coisa pública, em que salientava a necessidade de se estabelecerem voluntariamente medidas e políticas concretas com vista a objectivar a sustentabilidade, a contemplá-la, garanti-la e reforçá-la, porquanto corríamos o risco de num futuro próximo virmos a fazê-lo obrigatoriamente, pela pertinácia pouco esclarecida e forçosa do tem-que-ser que, como todos muito bem sabemos, tem muita força, não venham agora com igual veemência e empenho vociferar para os mesmos cafés e esquinas dos Rossios, confirmando que já sabiam que isto ia acontecer pois tinham-no lido nelas, nessas excomungadas crónicas, cujo único defeito que lhe encontraram, como basto motivo para a dor de corno que lhes provocou a tamanha comichão nos tutanos da consciência, era ou foi, o de estarem com alguma lógica e sensata razão. E é pena, porque essa atitude seria interpretada como um rebate de consciência, um remorso adulto e avisado, demonstrativo da capacidade cívica e educada que gerações alfabetizadas ganharam com a escolaridade (obrigatória?) tida, ou pelo tempo que passaram a puir os fundilhos nas carteiras da Corredora, da Fontedeira, da Estrada da Serra e do Magistério, como sob os demais "edificados" telhados na alçada dos Duarte Pacheco, deste e anterior tempo, tecendo e remendando os palimpsestos da Cartilha herdados ao serôdio de um João de Deus que lhes acordou as mentes para as manufacturas do odiar com facilidade, e respeitar com despeito ou exagerada e precavida moderação, ainda assim o respeitado não lhe dê uso e se convença ser isso sinal do considerá-lo alguém.
Todavia, é um lamento pouco pronunciado e de menos lamentado, uma vez que mais se assemelha àquele "cochicho murmurado" no escuro da plateia durante uma sessão de dejá vu como as que habitualmente se exibem nos actuais palcos da originalidade, entre velhos Marretas do mesmo ofício, alicerçado no contrabando platónico entre o ideal e o real à mercê do vice-versa, que é câmbio para todo e qualquer talento. É antes um chorinho sob a batuta do não-te-disse-agora-aguenta-te que é para ficares a saber o que é bom prà tosse, com que sacudir a água do capote, e determinar a forma de colaboração regimental disponível sob a bitola do vamos ver o que se pode arranjar, mas desde já te digo que não mereces nem um quinto de quanto possa vir a fazer por ti. Murmúrio assaz legítimo, considerando que o não-fazer me é um direito consagrado agora, como o foi o teu igual não-fazer nem deixar que alguém faça quando estavas sentado na burra. Porque, caro (e)leitor, não é por teres tido toda a vida uma fértil sorte e caganeira, que se conquista a cátedra de passar atestados de tacanhez & vilanagem a toda a gente, apenas porque ela – essa gente – é diferente e a falta de cuidados paternos/maternos a incapacitou (p.ex, com 71%) para toda a vida. Porque, até podes ter direito à ignorância e indiferença, até podes achar que é um bem voltar à terra tal e qual como caíste do sobreiro, agora do que não te assiste qualquer direito é o de impedir o acesso ao conhecimento e cultura a quem não bate palminhas aos teus arrazoados, requiens pindéricos, discursos de homenagem e suserania, elegíacos epitáfios, com a respeitável e diplomática inteligência do burro coça o burro, porque se aqui nada foi dito acerca do passamento de José Saramago, não foi por ressaibo, negligência nem má vontade, mas sim porque nada há a dizer quando uma vida se cumpre, seja ela a de um escritor Prémio Nobel, seja a de uma couvinha tronchuda ou galega, posto que a vida, isso que se supõe ser uma linha continua entre o nascer, crescer, procriar e morrer, é igual para todos, e não é agora que morreu que lhe vou ler a obra, uma vez que o li e divulguei em basta suficiência, mesmo sabendo que as susceptibilidades feridas, ao fazê-lo, podiam exercer o seu direito de afronta, ressentindo-se com a ousadia, e retaliarem com a respectiva excomunhão. Que, aliás, de nada lhes valeu, uma vez que continuei a escrever e, ao contrário deles, a ser lido, considerando que as suas publicações e pasquins encerraram a loja com a crise, em consequência de uma outra anterior que era a de valores humanos e éticos, que é coisa que não vinha de brinde, como as cartas de condução, nas farinhas Amparo, Predilecta e Trinta e Três.
Portanto, convinha que se deixassem de queixinhas e lamechices, que para esse peditório já dei! Porque só há uma maneira de celebrar/homenagear legitimamente um autor, que é lendo-lhe a obra, e isso eu fiz de fio a pavio, como se estivesse a ler o Pentateuco dos pequeninos.
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