A Lição de Burke



Da Teoria Missionária e Expansionista dos Rústicos e Campónios...

"Eles defendem os seus erros como se
estivessem a defender uma herança."
E. Burke

É bastante comum depararmos com gente que parece regular mas, passados momentos, como às maçãs vistosas em cujo interior mina a lagarta da fruta, notamos que estão estragados, ou estragadas, por dentro, precisamente naquele pomo que mais importa à (com)textura da alma, que é a mentalidade. Merecem a nossa compaixão, é certo, a nossa pena e dó, é indubitável, todavia deve ter-se cuidado quando nos aproximamos, não por isso ser contagioso, ou veicular pessonha, antes sim para os não levarmos a sério nem termos em conta quanto dizem ou fazem, pois se o fizermos estaremos indiscutivelmente em sarilhos, sobretudo com eles e elas, porquanto ouvir e respeitar uma pessoa que não se ouve e muito menos se respeita é acto perigoso do qual pode resultar dano grave, a quem não se precaver atempadamente. Porque não aprenderam a estar e a ser, em termos normais de sociabilidade, uma vez que não sabem ouvir os demais, ficando assim amputados/entupidos no principal canal de fluência de comunicação e intercâmbio com o exterior, e criaram um dicionário particular em que raramente o significado das palavras que nele coleccionaram corresponde ao sentido que convencionalmente lhe foi atribuído. Aquilo que serve para aproximar umas pessoas das outras, a fala, neles servem exclusivamente para afastar ainda mais quem dificilmente se tocava e percebia. Enfim, estão gravemente doentes, enfermos duma moléstia incurável que a ignorância alimenta e faz evoluir, e que à medida que a sua resiliência vai prescrevendo mais se nota e agrava: crise de identidade, com vertentes fabulatórias e confusionistas.
Missionários expansionistas da quezília e confusão, distorcem a realidade conforme as suas necessidades de entendimento, e onde os demais, por exemplo, subscrevem partilha lêem (ou ouvem) exibição, por conversar entendem discutir, por observar, criticar, e por criticar, depreciar. E por compromisso sob o anteriormente acordado, identificam invariavelmente arrependimento.
Mas todavia, contudo e sinceramente, num tripartido genesíaco sob a trindade da adversidade, não deixa de custar-me a perceber como é que pessoas que, além de incompetentes e autênticas fraudes "profissionais", são eticamente tão imaculadas que nem uma carrada de esterco de porco, e mentalmente ordinárias que nem uma vala de esgoto a céu aberto, se podem outorgar modelos a seguir seja no que for, e muito menos nas práticas, procedimentos e operação de computadores, quando tudo quanto fizeram até hoje, nesse capítulo, mais não foi que disseminar a sua falta de cultura, espalhar a sua ignorância e arregimentar a sua mediocridade numa mediocridade maior, mais abrangente e correligionária ao corporativismo. E que obstinadamente insistem em exigir que se tome por bom e útil tudo quanto fazem quando inconfundivelmente apenas resvalam no lodo da sua perversão e incompetência. Atrevendo-se ainda a acharem-se mal pagas por isso, logo, que não lhe podem pedir melhor desempenho... O que não só é logro, como igualmente um roubo à colectividade que paga impostos dos quais são retirados os seus salários, bolsas ou abonos.
Não percebo. E provavelmente ninguém perceberá, mas para essas pessoas não há mistério nenhum, além de se considerarem meritórias de parasitar a sociedade por direito "quase divino", quiçá herdado de geração em geração por via familiar, também devem achar-se o supra-sumo da beleza, perfeição e inteligência, considerando que se posicionam sempre num patamar superior ao comum dos mortais para quem errar, por mais pernicioso e abominável, é incontestavelmente sinónimo de preocupada inovação. Nada importa que seja funcional e útil desde que lhe não possam aplicar o seu toque de génio, que é, afinal, torná-lo imprestável para todos mais, mostrando quanto lhes apraz mas condenando por abuso e ingerência na sua privacidade os que olharem e virem. Num golpe de asa e em voo certo na admiração dos seus congéneres... Porque a imitação é, entre os medíocres, a nota exemplar com que se pode atingir a mediocridade suprema, o reconhecimento da corporação e da generalidade dos seus elementos.
Ora, vem a prédica a propósito, depois de terem vindo a lume algumas notícias sobre o caso Freeport... Os procuradores (Vitor Magalhães e Paes de Faria) tinham vinte sete (noves fora nada) perguntas a fazer ao primeiro-ministro e, se calhar, outras tantas ao ministro da Presidência, mas como o pedido não chegou a tempo para o prazo de conclusão do inquérito (25 de Julho), ficaram assim inviabilizadas todas as diligências que se necessitassem para esclarecer melhor e mais justamente se fazer justiça. O Procurador Geral da República escreve num comunicado de nove pontos (noves fora nada) que vai ordenar a curto prazo um inquérito para o integral esclarecimento das questões de índole processual e deontológica. Os prazos vão-se esgotando desde 2006 para isto e para aquilo, os sete milhões que deram de frosques continuam a monte, a lei do empurra continua a fazer o seu jogo, espera-se pela aproximação do prazo para a conclusão da fase de inquérito a fim de se pedir para serem ouvidos este ou aquele, que chega fora de tempo, a fim de se realizarem diligências complementares, etc., etc., repetindo e imitando o modus operandi dos burocratas kafkinianos da outra senhora, enrolando, empurrando de Herodes para Pôncio Pilatos (lavar as mãos – e as verbas), até que finalmente já ninguém saiba o que é que está realmente em questão, resolvendo por cansaço das partes um processo onde todos tinham fortes probabilidades de sair mal na fotografia, como no ditado do que vai à vinha e do outro que fica à porta.
E porquê? Porque, como afirmou Burke, e foi "afixado" em epígrafe, há quem considere o erro (ou a corrupção) uma herança de enorme mais-valia cultural em todos os sectores do Estado, e que por tal deve ser defendida, pois precisa que se continuem a ganhar causas com truques de secretaria, precisa de ver garantida a sua sobrevivência, ter assento na administração das tutelas, onde possa continuar a tecer os seus enredos retóricos e semânticos para adiar a transparência necessária à justiça, uma vez que só assim poderá continuar a exigir aos demais o cumprimento duma lei que não segue.
Ou seja, o Freeport é apenas mais um monumento nacional, património cultural de um povo que continua a ser lusitano, e como tal, independentemente de ter uma tecnologia avançada e um sem-número de universidades continua a ser o mesmo lusitano, a roubar pelos mesmos motivos e igual êxito, a matar pelas mesmas razões, a violar e espancar o género oposto com a mesma acuidade e orgulho, a contornar a lei com a idêntica heroicidade e defraudar o desenvolvimento com igual desenvoltura e sucesso com que os Viriatos distorciam e destroçavam as ordens romanas, emboscados nos recôncavos e ermitérios (herméticos e hermínios) da rústica e campónia soberania. Bem ajam, então por isso, que cá estamos nós para levar bordoada na ética e competência profissional sempre que nos atrevamos erguer a voz no estrangeiro: afinal, aquilo que se herda nunca se muda, e deve defender-se como um bem imprescindível, imperdível, pese embora seja a maior porcaria que existe à face da terra, como cultura... – É tradição!

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