Sou um autor de ficção científica e um historiador. A combinação
não é tão invulgar como parece – para citar só alguns exemplos, Barabara
Hambly, Katherine Kurtz, Judith Tarr, Susan Shwartz e John F. Carr usaram o que
estudaram no colégio para dar profundidade e autenticidade aos mundos que
criaram. No meu caso a ligação entre as duas coisas é ainda mais estreita. Se
não fosse um leitor de ficção científica, provavelmente nunca teria acabado por
ser um estudioso de história bizantina. Andava no liceu quando li LEST DARKNESS
FALL, o clássico de L. Sprague du Camp, em que ele lançava um arqueólogo moderno
na Itália do século sexto. Comecei a tentar descobrir quanto era inventado e
quanto era real, e fui apanhado. O resto, de várias maneiras, é história.
Este livro, portanto, assenta fortemente no meu fundo académico.
Passa-se no começo do século catorze de um mundo alternativo em que Maomé, em
vez de fundar o islão, se convertera ao cristianismo numa missão comercial no
interior da Síria. Em consequência, a grande exploração árabe dos séculos
sétimo e oitavo, que no nosso espalhou o islamismo desde o Atlântico até às fronteiras
da China, nunca aconteceu. O Império Romano (a que na sua forma medieval,
oriental, damos o nome de Império Bizantino) nunca perdeu a Síria, a Palestina,
o Egito, e o Norte de África para os invasores, nunca teve de lutar pela sua sobrevivência
na Ásia Menor ou de defender Constantinopla num sítio que, se perdido, teria
levado o Império a cair em ruínas.
Libertado dessa desesperada pressão do Leste, o Império teria
tido uma intervenção mais ativa na europa Ocidental do que teve no nosso
universo. Através dos séculos retomaria a Espanha aos visigodos, a Itália aos
lombardos, a maior parte do sul de França aos francos. Para os estados
ocidentais que mantinham a sua liberdade, Constantinopla seria tão invejável
quanto temível.
A leste, a história da Pérsia, a antiga rival de Roma, também
diferia muito do seu destino no nosso mundo. Sem as invasões árabes a deitá-la
por terra, continuaria a ser a outra grande potência no mundo a oeste da China,
a única nação que poderia tratar o Império como igual. Por vezes os dois
estados entrechocar-se-iam abertamente; com maior frequência manobrariam para
ganhar uma vantagem ali, para fomentar problemas nas que o outro ali tinha.
Cada um de sua parte, continuaria a sonhar e a trabalhar para a vitória final
que nenhum deles alguma vez vira.
Tal seria o mundo de Basil Argyros, soldado e agente do Império. Um mundo talvez mais conservador do que o nosso, pelo menos no sentido de ter mudado menos drasticamente desde os tempos clássicos. Mas nenhum mundo, como Argyros sabia (nem sequer para meu conforto), se mantém sempre o mesmo.
Tal seria o mundo de Basil Argyros, soldado e agente do Império. Um mundo talvez mais conservador do que o nosso, pelo menos no sentido de ter mudado menos drasticamente desde os tempos clássicos. Mas nenhum mundo, como Argyros sabia (nem sequer para meu conforto), se mantém sempre o mesmo.
Uma nota final na cronologia: os bizantinos não usavam muito
frequentemente a Incarnação como o ponto de partida para a sua era. O ETOS
KOSMOU (ano do mundo) corria de 1 de setembro a 31 de agosto e era contado da
Criação, que os estudiosos bizantinos datavam de 1 de setembro de 5509 a.C.
Portanto, o etos kosmou 6814, o ano
em que esta história começa, decorre de 1 de setembro de 1305 a 31 de agosto de
1306.
In HARRY TURTLEDOVE, Agente de Bizâncio, título original Agent
of Bizantium, trad. Eurico da Fonseca, col. Argonauta, Edição «Livros do
Brasil» Lisboa. Dois volumes.
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