A Lei dos Profetas



Pôr o Peixe a Render...

“Não faças aos outros aquilo que não queres que te façam a ti”
– Regra de Ouro (Universal) – Diálogos de Confúcio, XV, 23

Quando temos de fazer uma escolha e a preterimos ou adiamos, estamos necessariamente já a escolher algo que não é lana-caprina a respeito do conteúdo profundo dela, mas antes a operar na esfera da sua contabilidade e na medida exata dos preconceitos e resistências envolvidas nessa decisão que, em si mesma, é causa e consequência dessa escolha. Os meus avós diziam que quem não quer ser lobo não lhe veste a pele, e contavam uma história com moral acerca dessa atitude, com a devida ilustração retirada à vida real, quiçá temendo que um dia eu viesse a cair na mesma patetice. Fizeram bem, foi uma escolha acertada, pois se assim não me tivessem avisado, muito dificilmente lhe teria dado ouvidos, e talvez agora nem já existisse para cronicar sobre esta ou possíveis, como restantes, momentos e versões da História. Sobretudo porque parece que há políticos que assumem e tomam posições radicais – sim, porque abater um governo e dissolver a Assembleia da República não passa por moderado em lado nenhum! – mas depois se esquecem do que fizeram e vêm apodar as pessoas que defendem a sustentabilidade económica, social e ambiental de extremistas e perigosos radicais… Ora, cozam-se! – como dizia o Barnabiças do Altino do Tojal.
Até há bem pouco tempo vivíamos, e ainda vivemos, numa sociedade em que o conhecimento não se conservava, embalava e comercializava melhor do que o peixe – conforme a propósito salientou A. N. Whitehead, no seu The Aims of Education –, isto é, em papel, de jornal ou vegetal, cuchê ou bíblia, não importa, porquanto se tratava de reatualizar e reavivar, rejuvenescer sob empacotamento – marketing quase tudo e uma mancha (gráfica) de imaculada sujidade –, um tipo de sabedoria e beleza que, sem "a magia" da educação e do ensino, ficariam irremediavelmente perdidas num passado mais ou menos remoto.
O peixinho, na gíria dos ganzados ervistas e haxixinos diz-se "o peixe", embora não haja ninguém que duvide que um é tão-só e unicamente a metáfora para o outro, qual eufemismo para amaneirar a toxidade do dito, era ingerido, assimilado, por aqueles que lhe podiam chegar, tal como ao ensino superior na modernidade laica e talibanizada se apresenta, e depois de servido pelas mais inusitadas pedagogias, era mastigado à pressa, sob a frugalidade de um Bolonha mal entendido e pior gizado, engolido por compêndio ou sebenta, e vomitado em relatórios ou exames, após o que seria processado burocraticamente para, finalmente, sair em canudos mais ou menos espessos ou grossos, que serviam para tudo, desde a fertilização dos solos inóspitos e bárbaros das terras fracas do além-mar, até à fabricação de telescópios de ir longe na carreira ou ver Braga à mão de colher.
Porém, aconteceu que uma madrugada qualquer, muito diferente da outra em mudanças e vontades, surgiu a crise montada num cavalo branco da coudelaria de São Bento, a escoucear no empedrado da vida, paralelo aqui, para Lelo ali, entre as necessidades e os prazeres, os carmos e as trindades, e eis que na desventura arrastou consigo os eleitores que gostam de jogar em tudo que meta um Xis, assinatura ou totobola, para elegerem novamente para os mesmíssimos lugares e cargos aqueles que exclusivamente contribuíram para a sua dissolução, coisa estranha e absurda, uma vez que não há tino a bater certo que acredite serem os mesmos que geraram a atual crise política quem está melhor preparado para a resolver.
Ora é precisamente a isto que me refiro quando digo que andam a fazer render o peixe quando se aplica um diploma para enganar os demais da pátria, seja ela do Algarve ao Minho ou do Minho até Timor, ainda que língua como almejava Pessoa, atribuindo-lhes o estatuto de pategos e não de pessoas, que o foram elas e eles, e há muito que lhe tinham feito já o manguito do fiado, no caviar do queres o voto, TOMA, de lamber os bêços depois de uma boa feijoada regadinha a tinto de lei, que isso de decidir sem a barriga bem forrada por dentro, ainda que seja para escolher os que lhe hão de vir a fazer o ninho detrás da orelha, não é coisa que se faça de ânus leve. É preciso ter canudo.
Então não atenteiem bem, e depois queixem-se, que nem as canábis vos hão de valer!

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