Ecologia Política
Desde há muito tempo que os arrivistas políticos têm vindo a usar a ecologia como biombo e trampolim de impulsão, na tentativa de ascenderem aos mais altos cargos da nação. A coisa não é novidade nenhuma, e já em 1981, António Elói, na rubrica Ponto de Encontro, que era aquela secção aberta à participação dos leitores, na Revista Sobreviver, apontava as linhas gerais desse contencioso que o tempo, ao contrário do esperado, por tudo resolver, apenas agravou. Dada a pertinência e desenvoltura do texto, em seguido o transcrevo, para que não restem dúvidas a quem pensa que está agora a descobrir a pólvora pròs fósforos, que essa atitude foi bastante comum em precoces datas, andaria ainda a ecologia de fraldas e gatinhas, arriscando sérias quedas dos bordos da democracia portuguesa, também ela sobejamente imberbe e de faces extraordinariamente salpicadas pelo acne da abrilenta adolescência política. Ei-lo:
O MOVIMENTO DA ECOLOGIA POLÍTICA
A luta ecológica não é um fim em si, é um meio
1.
A ecologia, não obstante o seu carácter difuso e pouco teorizável, não obstante ter uma pequena dimensão, a dimensão das coisas e das pessoas, foi, é, vai sendo apropriada por técnicos e políticos.
A ecologia vai sendo roubada àqueles que passeiam, ao longo do rio e sabem que o amor é uma mão, um olhar que troca. Àqueles que transformaram o cor-de-rosa dos sonhos em realidades.
Técnicos e políticos apoderaram-se da ecologia. Uns transformaram-na em dados frios e escuros de números e estatísticas, em coeficientes e projectos antipoluição. Outros encontram aí o maná de Canaã, a receita contra o esquecimento; a novidade e inovação que falta a quem não tem imaginação...
E nós? Vamos deixar de ser ecologistas? Vamos superar o actual estado de fraqueza e dispersão em que nos encontramos? Que fazer?, para glosar um velho político.
A resposta é individual, mas é pensada em termos de um colectivo. É a ocupação de um espaço de vida. É o tempo e o movimento.
2.
As experiências e vivências de outros podem ser-nos úteis, mas quando buscamos nuns lábios outros infinitos é sempre diferente. O sangue que percorre o nosso corpo vai-se renovando em cada momento. Temos de encontrar o nosso momento, o tempo de transformar. Eu. Tu. A Vida.
A teoria é o abstracto que se vive: são os nossos desejos pensados em fórmulas. Há que dar aos desejos realidade. A ecologia política é o assumir dessa realidade. É a recusa da ecologia como cantinho das novidades dos políticos. É dizer Nós e significar que os políticos são uma parte, o passado da vida. O futuro é amanhã.
Para Nós a ecologia política não precisa de se definir. É o espaço de cada um e de todos. Das mulheres em luta pelo seu ser. Dos poetas em luta contra o nuclear. Das flores, da não-violência em luta contra o barulho. O espaço do sonho onde cabe a antipsiquiatria e o dissidente soviético, a cultura e o guerrilheiro afegão, os sábados livres e o operário polaco, a diferença e os indígenas americanos. E cabem todos aqueles que lutam individual e colectivamente pela justiça. O salvadorenho, o negro do Soweto, a mulher somali e tantos, todos os outros. E esses, somos nós que queremos viver Hoje e Aqui.
3.
A ecologia política é um espaço muito grande, mas à medida de cada um, porque a ecologia política não é uma doutrina, um credo, não é tão-pouco uma referência. É uma prática.
Como todas as práticas é polimorfa e contraditória. É um local onde podemos concordar ou discordar, mas onde fundamentalmente podemos empreender a gestão colectiva da nossa vida e, essa, é sempre diferente.
O Movimento da Ecologia Política não precisa de programa, nem de declaração de princípios, esses são aquilo que cada um entenda. Os estatutos do Movimento são um quadro amplo onde os colectivos se encontram, funcionam como protecção jurídica e política.
Na Alemanha o Movimento Verde, em Itália o Partido Radical, em França o movimento embrionário que surge a partir do colectivo Gueule e do movimento autogestionário são algumas das referências que podem servir de parâmetros ao Movimento em Portugal. Ter em conta a distância cultural, sociológica e política é essencial, assim como é essencial ter em conta que a vida, o amor é sempre diferente e sempre um.
4.
Os nossos desejos, os nossos sonhos, as nossas fantasias convertem-se numa realidade. No movimento da ecologia política. Aqui, hoje, estamos solitários face ao papel branco. Amanhã, quando percorrer as ruas cinzentas da nossa cidade, vou-me recordar que a vida não é só as bandas desenhadas que lemos no nosso divã, nem se esgota no fumo que sai dos meus olhos. Está também nos sentimentos. Num sorriso, numa carícia. E que a revolução é uma festa de cada dia. É o sonho com as noites cálidas da Primavera...
Obrigado António Elói, e desculpa esta quase indevida apropriação das tuas palavras: é que elas hoje ainda nos fazem falta!
O MOVIMENTO DA ECOLOGIA POLÍTICA
A luta ecológica não é um fim em si, é um meio
1.
A ecologia, não obstante o seu carácter difuso e pouco teorizável, não obstante ter uma pequena dimensão, a dimensão das coisas e das pessoas, foi, é, vai sendo apropriada por técnicos e políticos.
A ecologia vai sendo roubada àqueles que passeiam, ao longo do rio e sabem que o amor é uma mão, um olhar que troca. Àqueles que transformaram o cor-de-rosa dos sonhos em realidades.
Técnicos e políticos apoderaram-se da ecologia. Uns transformaram-na em dados frios e escuros de números e estatísticas, em coeficientes e projectos antipoluição. Outros encontram aí o maná de Canaã, a receita contra o esquecimento; a novidade e inovação que falta a quem não tem imaginação...
E nós? Vamos deixar de ser ecologistas? Vamos superar o actual estado de fraqueza e dispersão em que nos encontramos? Que fazer?, para glosar um velho político.
A resposta é individual, mas é pensada em termos de um colectivo. É a ocupação de um espaço de vida. É o tempo e o movimento.
2.
As experiências e vivências de outros podem ser-nos úteis, mas quando buscamos nuns lábios outros infinitos é sempre diferente. O sangue que percorre o nosso corpo vai-se renovando em cada momento. Temos de encontrar o nosso momento, o tempo de transformar. Eu. Tu. A Vida.
A teoria é o abstracto que se vive: são os nossos desejos pensados em fórmulas. Há que dar aos desejos realidade. A ecologia política é o assumir dessa realidade. É a recusa da ecologia como cantinho das novidades dos políticos. É dizer Nós e significar que os políticos são uma parte, o passado da vida. O futuro é amanhã.
Para Nós a ecologia política não precisa de se definir. É o espaço de cada um e de todos. Das mulheres em luta pelo seu ser. Dos poetas em luta contra o nuclear. Das flores, da não-violência em luta contra o barulho. O espaço do sonho onde cabe a antipsiquiatria e o dissidente soviético, a cultura e o guerrilheiro afegão, os sábados livres e o operário polaco, a diferença e os indígenas americanos. E cabem todos aqueles que lutam individual e colectivamente pela justiça. O salvadorenho, o negro do Soweto, a mulher somali e tantos, todos os outros. E esses, somos nós que queremos viver Hoje e Aqui.
3.
A ecologia política é um espaço muito grande, mas à medida de cada um, porque a ecologia política não é uma doutrina, um credo, não é tão-pouco uma referência. É uma prática.
Como todas as práticas é polimorfa e contraditória. É um local onde podemos concordar ou discordar, mas onde fundamentalmente podemos empreender a gestão colectiva da nossa vida e, essa, é sempre diferente.
O Movimento da Ecologia Política não precisa de programa, nem de declaração de princípios, esses são aquilo que cada um entenda. Os estatutos do Movimento são um quadro amplo onde os colectivos se encontram, funcionam como protecção jurídica e política.
Na Alemanha o Movimento Verde, em Itália o Partido Radical, em França o movimento embrionário que surge a partir do colectivo Gueule e do movimento autogestionário são algumas das referências que podem servir de parâmetros ao Movimento em Portugal. Ter em conta a distância cultural, sociológica e política é essencial, assim como é essencial ter em conta que a vida, o amor é sempre diferente e sempre um.
4.
Os nossos desejos, os nossos sonhos, as nossas fantasias convertem-se numa realidade. No movimento da ecologia política. Aqui, hoje, estamos solitários face ao papel branco. Amanhã, quando percorrer as ruas cinzentas da nossa cidade, vou-me recordar que a vida não é só as bandas desenhadas que lemos no nosso divã, nem se esgota no fumo que sai dos meus olhos. Está também nos sentimentos. Num sorriso, numa carícia. E que a revolução é uma festa de cada dia. É o sonho com as noites cálidas da Primavera...
Obrigado António Elói, e desculpa esta quase indevida apropriação das tuas palavras: é que elas hoje ainda nos fazem falta!
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