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Xô, Melga!

Houve um tempo, reconhecidamente p.p., em que a Bíblia dos remediados era O Princípio de Peter, tendo por novos evangelhos O Receituário de Peter, onde se delineava o progresso da incompetência sob os auspícios da burocracia. Lançados apenas com a "intervalar" diferença de três anos – em 1969, o primeiro, e em 1972, o segundo –, destacam-se deles, actualmente, a influência que tiveram as suas 66 receitas e o seu Au Revoir ou Plano de Peter, na superintendência geral das nações reinantes da pós-globalização anunciada, que resumidamente são entendidas por G8, e que souberam bater a vénia ao progresso tecnológico desde a invenção da roda à sofisticada utilização do computador, provando que se desejarmos um mundo melhor ele não só é plausível como possível, uma vez que, tal como indicou R. Quillen, "se desejamos construir um mundo novo, temos o material à mão – o primeiro também foi feito do caos."
Ora, aproveitou, e muito atempadamente, Sua Excelência, o presidente da República, as celebrações do 5 de Outubro, para alertar os portugueses quanto àquilo que chamo o "Síndroma do Efeito Melga" (SEM) que está atacar os políticos e gestores nacionais, cuja identificação resulta precisamente da semelhança com esses insectos inoportunos e rabugentos, quando zumbindo nos atormentam o sono e atacam vampirescamente a fim de nos ferrarem para chupar o sangue, e depois de encherem a pança, ficam suficientemente pesados para retomar o voo, logo sujeitos a uma boa palmada que o esborrache ou um derrapanço, despiste por excesso de carga, que os leva a chocar contra as aguçadas esquinas da actividade escusa e nocturna da política, ética mercantilista e relacionamentos interpessoais.
Em termos populares, se dirá, que depois de encher o bandulho (às nossas custas) lhe fica pesada a pança para manobras, e vai daí que nós zás-pimba lhe ajeitemos o cachaço para entrar, sem bater com o toutiço, na viatura do quotidiano, que custa a todos, é certo, embora para alguns a insegurança nele seja mais insegura do que para outros, posto que se "o custo da vida sobe, e a probalidade de viver desce" (Flip Wilson), também as dificuldades nela aumentam conforme lhe diminuem as condições.
Por conseguinte, quando o nosso presidente, os incentivou ao rigor das contas e razoabilidade dos recursos, não só lhes puxa as orelhas, publicamente, como lhes lê a sentença que cada um, no seu íntimo, está disposto a aplicar-lhes: parem – incluindo os colarinhos brancos da justificação do impróprio e da incompetência com as estatísticas, sondagens, volume de negócios, colecções/recortes de argumentos e votações plenárias, actuações sindicais e dos movimentos corporativistas ou de Ordem – de sarrazinar quem lhes enche os bolsos, caso contrário, vamos todos ao fundo, e será a vós quem isso mais doerá, uma vez que maior queda terão, pois quem anda há tanto tempo cá por baixo já muito pouco pode descer. Que se do país virtual que criaram as consequências são autênticas e os males bem reais e dolorosos, nós não temos culpa absolutamente nenhuma, logo não entendemos por que havemos de ser nós precisamente quem mais sofre por isso, pagando o preço de uma crise cujo volume é exactamente igual ao somatório da vossa riqueza pessoal – obrigado Arquimedes, eu desconfiava que ainda havias de servir para alguma coisa! –, não só identificando assim quem e porquê a forjou, mas também quanto já lhes valeu, quantidade essa quanto os Estados Europeus estão dispostos a pagar para que volte a repetir-se. Porque se é certo não termos pão, sobra-nos sobremaneira a razão, e podemos estar a começar a ficar fartos das vossas ilegalidades, insustentabilidades, maluqueiras egoístas e manias das grandezas, que vos fazem andar a armar aos tordos, exibindo ostensivamente fortunas que não merecem, destruindo gradualmente o planeta, o país, a região, a localidade, hipotecando o futuro e desaprendendo o passado, em vez de andara gerir e governar os nossos recursos, a cada mais escassos quão essenciais, pois isso pode vir a dar muito mau resultado, porquanto uma das características do nosso povo é ser rústico mas nunca burro. Até pode carregar com a albarda da burocracia, desde que tal traga emprego aos seus filhos e filhas, que saíram da terra para estudar e ter uma vida melhor do que a eles mesmos coube em sorte, todavia se a trazem às costas, é por desconfiarem que podem regressar ao tempo em que transportavam as bestas em pelo, sob o efeito directos dos traques e sapiências de pança farta nas hierarquias várias. Mas é bom não esquecer, que até os mais velhos e entradotes começam a ser peritos no usufruto das novas tecnologias da informação e comunicação, que apenas é a sala/hall de entrada para a sociedade do conhecimento, coisa que torna as pessoas bastante mais activas, participativas, democráticas e capazes de sentir e partilhar aquilo que de melhor têm, na procura contínua de um saber ser, saber estar, saber aprender e saber ensinar, não só com vista a melhorarem o presente, como igualmente a salvaguardarem as condições de vida e de futuro de seus filhos, netos, bisnetos, trinetos, e por aí fora, até que a eternidade se canse de ser eterna, o que denotaria claro esquecimento da vida dos seus pressupostos, objectivos e estratégias, sucedância improvável de alguma vez vir a acontecer, ou acontecendo aqui desacontecerá acoli simultaneamente, pelo que será sol de pouca dura e nenhuma consequência.
Portanto, importa não esquecer, reiterando o afirmado por Aníbal Cavaco Silva, que a contenção nas despesas, a formação dos profissionais, a aplicação da ética de rigor contabilístico e orçamental, bem como o responsável e consciente esclarecimento das prioridades, são para praticar pela administração central, local, pública e privada, caso contrário se arriscarão a acabar por esborrachar os ovos de ouro, mas igualmente a matar a galinha que os põe. Sobretudo porque estando nós SEM empregos, SEM perspectivas de futuro, SEM segurança, SEM justiça, SEM educação, SEM segurança social, SEM habitação, SEM ambiente, SEM financiamento, SEM ética administrativa e SEM respeito e consideração da parte dos funcionários públicos centrais e locais, é bem possível que vos mandemos à fava e pregar no deserto quando vierem queixar-se de estar a ser vítima dos SEM que criaram, almejaram e aperfeiçoaram a expensas de nós todos, SEM excepção, como fazem exactamente agora com as circunstâncias de falta de liquidez dos bancos, que são produto da vossa SEM-vergonhice, como o seria qualquer tiro no pé dado por quem, ao apontar ao próximo se esqueceu de tirar as botas de cima da secretária onde exerce a sua gestão SEM escrúpulos e SEM regras, SEM regulação e SEM habilitações suficientes e necessárias para compreender que a cidadania é uma via com dois sentidos. Creio que se sentem defraudados por não poderem ganhar mais, SEM pôr em perigo aquilo que já amealharam. É pena. E notória a vossa desumanidade face àqueles, que pela vossa mão, até se não importam de ganhar menos, pois quem de noves tira nada fica, se quem precisa de provar o nada que tem, mais não lhe vale do que ter nada para ser quem é, sendo ninguém. Nem virtude por não ter, perante o vosso virtuoso lucro, ganho no produto virtual, com que engordou o vosso SEM.

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