COMO, PORQUÊ E COM QUEM?




COMO, PORQUÊ E COM QUEM? 

"Não há igualdade ou justiça possíveis enquanto todas as vidas não valerem exatamente o mesmo." 

In CLÁUDIA SEMEDO (Embaixadora do Ano Europeu Para o Desenvolvimento), Direito à Vida, jornal PÚBLICO, de 17.08.2015 

Quando desconhecemos o que uma "coisa social" é, camuflamos a nossa ignorância acerca dela, afirmando o que ela já foi ou o que poderá vir a ser – SE. E a modinha pegou de estaca nas hostes políticas e jornalísticas. Perante a incerteza no que irá dar o 4 de outubro, inventam-se cenários e reiteram-se intenções, alinham-se baterias e pontarias, preenchem-se as linhas em branco dos programas eleitorais como quem aposta no totobola, e reza-se às padroeiras e padroeiros com bênçãos de pó-de-ser e demais sortilégios disponíveis, incluindo as sondagens habituais. Umas quantas forças a concurso, para obterem vantagens competitivas, apostam com múltiplas, esbanjando os créditos em duplas e triplas, a que dão o pomposo nome de coligações. Depois, nos programas de conjunto tocam à Ten Years After, com o homem da viola à frente a tocar o que lhe dá na gana, num banzé de acordes ou soundbites, e os restantes da instrumental confraria a desunharem-se para acompanhá-lo, ainda que desafinados e molestados pelos costumeiros feedbacks  e boomerangs, determinando que vão fazer isto & aquilo, assado & frito, mas sobretudo no limpinho sem espinhas como se a oposição estivesse de férias ou tivesse abdicado de ser oposição para ser uma vencida colaboracionista e empenhada. E, invariavelmente, fazem-no naquele registo mágico típico de quem acha que toda a gente não tem mais nada pra fazer do que tentar adivinhar o que querem, porque o querem, como o querem e de quem dispõem para fazer... Sumidades! 

Quando se é novo e inexperiente acreditamos que somos capazes de todos os possíveis só com o estalar dos dedos ou o embonecado bater das pestanas. Mas, na generalidade, crescemos, e verificamos que não é bem assim. Que tem de se estar ao corrente das problemáticas, familiarizados com os assuntos, estudá-los a fundo, experimentar as soluções plausíveis, validar as funcionais e fazer contínuas atualizações nelas. E fazemo-lo regra geral, sem stress de maior, nem pruridos vergonhosos. Porém, a exceção privilegiada dos que ingressaram na carreira política, consideraram que isso seria uma perda de tempo, quer por exigências de sedução do eleitorado, quer por mandriice natural, quer por considerar que a política é um atalho para o sucesso e fortuna, preferindo manter-se infantis, quais gracinhas imprestáveis, larocas e bem-falantes, imprescindíveis para enfeitar os frisos da magna nacionalidade, embora não acarretem qualquer benefício aos seus conterrâneos e territórios. 

E vai daí, ei-los que embrulham as habituais e fantasiosas promessas em celofane de compromisso/estimativa, que é o marketing da embalagem a invadir a composição "química" dos conteúdos, e toca de nos impingir a garantia de que vão baixar o défice, aumentar o crescimento, restruturar/renegociar a dívida, quiçá atirá-la ao mar que é uma economia que promete mundos sem fundo, criar uns tantos mil empregos (que depois vão cair nas malhas dos seguros/subsídios de desemprego mal terminem essas ações de combate ao ócio), apostar na cultura e no património, melhorar a qualidade de vida, disponibilizar saúde, educação, bem-estar, justiça, habitação, segurança social, sustentabilidade, transportes, segurança, ordem e perspetivas de futuro até para os hipervelhos. Esquecem-se é de dizer como vão fazer isso, com que dinheiros e especialistas, com quem contam para os desempenhos e tutelas, que certificados de boas práticas já têm em currículo, e quem lhos passou... Enfim, retemperam as ideias de igualdade e de justiça social com o seu direito imaculado de gente superior e superiormente bem-intencionada em quem devemos acreditar cegamente e delegar as nossas esperanças e expetativas, prò melhor e prò pior, pois "ao menino e ao borracho, mete Deus a mão por baixo", atribuindo-nos o estatuto de trouxas e ingénuos, como se as nossas vidas valessem menos do que as dessa iluminada elite. Contudo esquecem-se de uma coisa... De quê? De reler a epígrafe deste artigo, que transcreve o pensamento europeu através da sua embaixadora para o desenvolvimento, e que nos alerta para o detalhe de que "não há igualdade ou justiça possíveis enquanto todas as vidas não valerem exatamente o mesmo". E nós já sabemos há muito tempo que não queremos para nós o que nem os gregos quiseram para eles. Nem mais!  

Joaquim Castanho

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