ANTES COMO DEPOIS, SE MELHORÁMOS SÓ FOI À MODA DO NÃO




ANTES COMO DEPOIS, SE MELHORÁMOS SÓ FOI À MODA DO NÃO


Ensanduichados, sacrificados, crucificados e expostos ao vexame global entre dois energúmenos comprovados, nós, os cidadãos comuns deste povo com oito séculos de História e milénios de memória, engavetado (ou encavalitado) na ponta sudoeste da Europa, que se apresta para ir às urnas, depois das férias do verão, enganado e malnutrido como qualquer rês que escapou à seca e à fome, mas não foi suficientemente expedita para mudar para melhores pastagens e condomínios, pelo que o abate se avizinha mais rentável que mantê-la viva até ao reverdejar dos campos, que eram verdes da cor do limão, mas agora só são amargos e ácidos e dão calhaus em vez de pão, talvez aumentando ainda mais o bambúrrio dos partidos do arco da governação com o laxismo usual e costumeiro com que tem justificado a habitual (e elevada) abstenção. Uns dirão que é a descrença na democracia, outros o capitalismo, aqueloutros o fado, mas todos atiram à sorte a ver se pega, pois mais não fazem do que alvitrar dogmaticamente, já que escondem a verdade para arranjar culpados externos, quando, afinal eles estão todos cá dentro e gordinhos e anafados, uma vez que aqueles que vituperam o FMI, o BCE e CE (enfim, a famigerada TROIKA), que foram os únicos que nos ajudaram nesta crise, ficando por nossos fiadores perante quem nos emprestou e empresta dinheiro para lhes pagar, querem continuar a ser os únicos beneméritos desta dívida, enquanto classe dirigente, autarquias, função pública, bancos, empresários, cadeias de hipermercado, segurança pública, ensino, saúde, segurança social e educação, tal como até aqui tem sucedido. Exatamente os mesmos que encheram as tulhas e agora bebem o vinho novo, dançando a ronda no pinhal do rei e da república, que depois de nos sugarem o corpo palitam os dentes com a alma esbelta, aguçada e esguia que nos sobra.

Ora os meninos e meninas não têm é vergonha na cara, essa é que é essa, pois se os cofres estão cheios, como disse a ministra Albuquerque, foi porque pudemos pedir emprestado ao mercado financeiro, que só nos emprestou mais capital visto haver a garantia que a TROIKA anda por perto, e dá uma mãozinha à coisa se der prò torto; senão, bem podíamos pôr dívida à venda que ninguém lhe havia de pegar, por mais altos que fossem os juros a que o fizéssemos, que na alta finança mundial podem ser egoístas mas não são parvos, nem lá, como aliás também cá, se dá nada a ninguém, ainda que sejam só uns míseros votos de que dispomos para ajustar as contas.

Agora andam na geraldina a vaiar quem lhes alimentou os apetites, lhes saciou as insuficiências e desequilíbrios, mas se não tivessem sido esses senhores de fora a ajudarem à governação, estávamos de pantanas, e ainda mais do que aquilo que não parece que estamos. Mas estamos. E estamos tal e qual como estávamos antes da TROIKA vir…
Havia desemprego? Havia. Agora também há. Havia corrupção? Havia. Agora também há. Havia baixo crescimento económico? Havia. Agora também há. Havia uma educação que deseducava? Havia. Agora também há. Havia falta de cultura, desenvolvimento, participação democrática, igualdade e cidadania? Havia. Agora também há. Havia uma saúde cara e ineficaz para quem não tinha de seu? Havia. Agora também há. Havia um governo sem soluções para os problemas dos portugueses? Havia. Agora também há. Havia uma oposição que era contra tudo incluindo contra ela própria? Havia. Agora também há. Havia um défice insustentável? Havia. Agora também há. Então, em que é que Portugal mudou? Só numa coisa: é que antes se íamos ao mercado financeiro pedir dinheiro emprestado faziam-nos o manguito, agora, olham para o FMI, o BCE e a CE, e se eles e ela lhes dão garantia de cobertura da dívida, eles emprestam, mesmo com juros de pouca substância e lucro…

Ou seja, se estávamos empobrecidos e endividados, pobres e com dívidas continuamos a estar, mas com menos população ativa, menos empresas públicas para privatizar, menos empresas e diminuída capacidade económica. Então para que serviu o último mandato legislativo? Para nada, exceto para ficar provado e comprovado que fazer as mesmas coisas nunca dá outro resultado. E isso já todos e todas sabíamos, ou se não sabíamos de afianço, já desconfiávamos com grande margem de certeza. Pois nenhum, nem nenhuma, de nós se chama São Tomé e não precisamos de ver para crer, sobretudo naquilo que já víamos muito bem no que ia dar – e deu.


Joaquim Castanho  

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