Mary Anne, de Daphne du Maurier
Mary Anne
Daphne du Maurier
Trad. Maria Irene Daun e Lorena
424 páginas
Mulher e escritora inglesa que atravessou quase todo o século passado (1907-1989), Daphne du Maurier é sobejamente conhecida entre nós, não só como acontece no resto do mundo, pelo reconhecimento natural do seu estilo, peculiarmente atraente, fácil e objectivo, isto é, que vai direito aos assuntos que quer escamotear, sem chicoelinas nem maneirismos, mas também porque a quase totalidade da sua obra – contos, romances, memórias, biografia – foi intencionalmente traduzida para português, de cá como de lá do Atlântico, onde títulos como Rebeca, O Outro Eu, A Sorrir Também se Vence, Os Pássaros e os Outros Contos Macabros, A Pousada da Jamaica, Prima Raquel, Voo do Falcão e a Casa da Praia, se tornaram familiares aos leitores, incluindo os mais escrupulosos, como a cinéfilos, uma vez que destes derivaram outras tantas adaptações cinematográficas, que o circuito comercial nos facultou. Mas é da história "verídica" da sua trisavó, Mary Anne Clarke, ou de quanto verídico ainda se podia coar das narrativas familiares, sobretudo acerca de uma pessoa que terá falecido em Bolonha, a 21de Junho, de 1852, logo há mais de um século e passado pelo crivo de duas gerações distintas, que a autora foi buscar o enredo e motivos descritivos deste romance, extraordinário sem dúvida, onde o retrato do tempo se cruza com um ambiente de sedução e sexo, tendo a alcova por antecâmara do poder cortesão, num intrincado de escândalos da alta sociedade, de corrupção e vitalidade das ruas londrinas, com uma pícara heroína não menos corrupta, não menos arrivista e, principalmente, também não menos torcidinha e credível.
Mulher bem dotada fisicamente, quer dizer, senhora de encantos vários, além de possuidora de uns angelicais olhos azuis, pois então, que escondem o frio calculismo da sua dona, nariz arrebitado e cabelo castanho-claro, o que mais arrebatava, ou electrizava quem com ela deparava, em Mary Anne, era porém o seu sorriso, que parecia troçar indiscriminadamente tanto de quem gostava como de quem desprezava, confundindo para reinar e reinando seduzindo, enredando pela dúbia teia, as vítimas da sua atenção. Sacrificada, oprimida, pobre, oriunda do sopé social e pouco escrupulosa, decidiu pôr a sua beleza ao serviço da sua libertação, numa carreira ambiciosa, e como trampolim ideal que lhe facilite a ascensão desenfreada. Só que depois não consegue parar e lança-se, graças ao seu desmedido amor pelo dinheiro, ou poder que dele advém, num ciclo de ousadias perigosas e nada honestas, que culminam no vender de comissões militares, tráfico esse que deu origem a mais um escândalo que, na época, correu mundo e abalou o país, além do que obrigou o Duque, o aristocrata da sua garantia, a responder perante o parlamento, assim como ameaçou fazer ruir a sua fortuna pessoal. Aliás, fenómenos de outros tempos, embora pouco estranhos aos actuais, o que, indubitavelmente, empresta a este romance a sua validade clássica, como um direito de estilo... e género.
Daphne du Maurier
Trad. Maria Irene Daun e Lorena
424 páginas
Mulher e escritora inglesa que atravessou quase todo o século passado (1907-1989), Daphne du Maurier é sobejamente conhecida entre nós, não só como acontece no resto do mundo, pelo reconhecimento natural do seu estilo, peculiarmente atraente, fácil e objectivo, isto é, que vai direito aos assuntos que quer escamotear, sem chicoelinas nem maneirismos, mas também porque a quase totalidade da sua obra – contos, romances, memórias, biografia – foi intencionalmente traduzida para português, de cá como de lá do Atlântico, onde títulos como Rebeca, O Outro Eu, A Sorrir Também se Vence, Os Pássaros e os Outros Contos Macabros, A Pousada da Jamaica, Prima Raquel, Voo do Falcão e a Casa da Praia, se tornaram familiares aos leitores, incluindo os mais escrupulosos, como a cinéfilos, uma vez que destes derivaram outras tantas adaptações cinematográficas, que o circuito comercial nos facultou. Mas é da história "verídica" da sua trisavó, Mary Anne Clarke, ou de quanto verídico ainda se podia coar das narrativas familiares, sobretudo acerca de uma pessoa que terá falecido em Bolonha, a 21de Junho, de 1852, logo há mais de um século e passado pelo crivo de duas gerações distintas, que a autora foi buscar o enredo e motivos descritivos deste romance, extraordinário sem dúvida, onde o retrato do tempo se cruza com um ambiente de sedução e sexo, tendo a alcova por antecâmara do poder cortesão, num intrincado de escândalos da alta sociedade, de corrupção e vitalidade das ruas londrinas, com uma pícara heroína não menos corrupta, não menos arrivista e, principalmente, também não menos torcidinha e credível.
Mulher bem dotada fisicamente, quer dizer, senhora de encantos vários, além de possuidora de uns angelicais olhos azuis, pois então, que escondem o frio calculismo da sua dona, nariz arrebitado e cabelo castanho-claro, o que mais arrebatava, ou electrizava quem com ela deparava, em Mary Anne, era porém o seu sorriso, que parecia troçar indiscriminadamente tanto de quem gostava como de quem desprezava, confundindo para reinar e reinando seduzindo, enredando pela dúbia teia, as vítimas da sua atenção. Sacrificada, oprimida, pobre, oriunda do sopé social e pouco escrupulosa, decidiu pôr a sua beleza ao serviço da sua libertação, numa carreira ambiciosa, e como trampolim ideal que lhe facilite a ascensão desenfreada. Só que depois não consegue parar e lança-se, graças ao seu desmedido amor pelo dinheiro, ou poder que dele advém, num ciclo de ousadias perigosas e nada honestas, que culminam no vender de comissões militares, tráfico esse que deu origem a mais um escândalo que, na época, correu mundo e abalou o país, além do que obrigou o Duque, o aristocrata da sua garantia, a responder perante o parlamento, assim como ameaçou fazer ruir a sua fortuna pessoal. Aliás, fenómenos de outros tempos, embora pouco estranhos aos actuais, o que, indubitavelmente, empresta a este romance a sua validade clássica, como um direito de estilo... e género.
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