Morte Dupla, de Dorothy Sayers

Morte Dupla
Dorothy Sayers e Outros
Trad. Eduardo Saló
228 Páginas

Dos sete autores policiais que colaboraram neste volume, cuja ideia coube a James Drawbell, editor do Sunday Chronicle, secundado nas responsabilidades por William Lees, editor do Allied Newspapers, apenas dois são realmente conhecidos do grande público português: David Hume e Dorothy Sayers. O primeiro desde mil novecentos e cinquenta e qualquer coisa, com a publicação entre nós de Os Mortos Não Discutem e Sinistra Partida!, este datado de 1953, traduzido por Mário Domingues, para a Colecção Máscara, da Editorial Dois Continentes; a segunda, pelo menos desde que se estreou na Colecção Vampiro, da Livros do Brasil, em 1949, com Qual dos Cinco, a que se seguiram Crime Perfeito, O Mistério do Bellona Clube, O Crime Exige Propaganda, Intriga e Veneno, O Gato de Diamantes, Quem Matou o Almirante e As Férias do Carrasco. E que, aliás, vem também a ser publicada pelas Edições70, na Colecção Alibi, nas parcerias A "Caixa", com Agatha Christie, e Por Detrás do Biombo, novamente com Agatha Christie e uns quantos outros escritores.
Todavia, este aparente anonimato dos restantes colaboradores, evidencia-se sobremaneira circunstancial, à medida que viramos páginas e dobramos capítulos, complementados com rodapés e notas elucidativas, que nos guiam, por assim dizer, aos bastidores da escrita, aos camarins da palavra criativa, e nos fazem enredar numa trama elaborada a várias mãos, diferentes percepções, mas sem nunca perder a unidade harmónica do fio discursivo, do enredo, e sobre o qual, sem dúvida, caso o não soubéssemos antecipadamente, ou não estivesse identificada, nos seria bastante difícil afiançar a sua díspar autoridade, jogo de muitos espelhos, embora orquestrados por um olho que tudo vê para melhor ligar as peças do puzzle.
Em a Morte Dupla, todas as regras do policial são respeitadas; o que não impede, porém, de manter o mistério e a expectativa até ao fim. Os crimes, o móbil, a arma, a lógica, a morfologia dos personagens, o suporte social, o quadro paisagístico, o enquadramento interpessoal, são factos descritos com minúcia e eficácia, e que colocam em pé de igualdade o leitor, o polícia e os autores, dos quais apenas um pode ser o Deus ex machina, para melhor alinhar os naipes e dirigir o concerto. Lê-lo é reconhecer que nem sempre a escrita é obrigatoriamente uma actividade solitária, mas antes se pode assemelhar, quer no toque e entoações, quer nos cenários e adereços, quer nos libretos e intervalos (prò chá), a uma opereta magnificamente interpretada como dirigida. Na linha de Quem Matou o Almirante, onde Dorothy contracena com Chesterton, John Rhode, Aghata Christie, Henry Wade, Anthony Berkeley e Freeman Wills Crofts – único que se mantém agora na equipa –, Sayers faz contraponto (arte de combinar melodias, ou de pôr em jogo, uns contra o os outros, temas ou enredos, personagens, de carácter oposto ou complementar) neste número, além de com o último e o já nomeado Hume, ainda com John Chancellor, Valentine Williams, F. Tennyson Jesse e Anthony Armostrong, todos arrolados no "London Dectetive Club", que é quem dá o mote e delineia uma narrativa deveras cativante. Aliás, fosse o caso de lhe darmos estrelas, o céu era dela!

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